Máquinas autônomas sempre foram apresentadas como promessa futurista em feiras e laboratórios, mas sua aplicação no campo real era limitada.
Agora, impulsionada por inteligência artificial embarcada, sensores de baixo custo, plataformas elétricas modulares e integração direta com fabricantes, essa tecnologia começa a gerar resultados mensuráveis na agricultura comercial.

Segundo relatório da Markets and Markets, o mercado global de automação agrícola deve alcançar US$ 20,3 bilhões até 2028, crescendo a uma taxa anual superior a 19%. O Brasil, um dos maiores produtores de alimentos do mundo, surge como uma das próximas fronteiras desta expansão que já faz parte do cenário agrícola em países mais avançados.
Automação para a eficiência máxima
O avanço dos sistemas autônomos no agro atende a uma combinação de fatores: escassez de mão de obra qualificada, pressão para reduzir custos operacionais, exigências ambientais mais rigorosas e a necessidade de operar com mais precisão e segurança. Inclusive à noite ou em condições adversas. Além disso, a maturidade das soluções de controle elétrico e da navegação autônoma em terrenos irregulares permite superar barreiras que, até pouco tempo atrás, travavam a adoção. Na prática, a automação deixou de ser um experimento caro para se tornar uma ferramenta operacional, com retorno econômico em janelas de tempo cada vez menores.
A adoção ocorre com mais rapidez nas culturas especiais, como pomares, vinhedos e hortaliças, onde o custo de mão de obra por hectare é alto e a operação exige navegação milimétrica. Nesse cenário, sistemas baseados em visão computacional realizam rotinas de pulverização seletiva, roçada entre linhas, capina mecânica e monitoramento fitossanitário.
Uma das grandes mudanças é a possibilidade de retrofit, ou seja, adaptar máquinas já existentes com sensores, atuadores e softwares sem obrigar o produtor a trocar todos os equipamentos. Essa abordagem nova reduz riscos e custos iniciais, permitindo escalar a automação passo a passo.
Os números da solução americana em vinhedos e pomares
Um exemplo notável vem da empresa Bonsai Robotics, fundada por Tyler Niday, engenheiro que atuou na Blue River Technology (See & Spray) e na John Deere. A companhia dos Estados Unidos combina visão computacional robusta (capaz de operar mesmo com poeira, detritos e baixa luminosidade) com controle elétrico e aplicações em máquinas novas e usadas.
Há bem pouco tempo a Bonsai adquiriu a Farm-ng, fabricante do robô elétrico modular batizado de “Amiga”, criado para propriedades de pequeno e médio porte, institutos de pesquisa e desenvolvedores. A integração reduziu drasticamente o atrito de adoção: o produtor pode começar com tarefas críticas e ampliar o uso conforme comprova ganhos reais.
Segundo dados da empresa, produtores reduziram custos operacionais em cerca de 45%, executaram tarefas até 60% mais rapidamente e registraram mais de 250 unidades entregues além de 45 implantações comerciais com OEMs como OMC e Flory. Os principais mercados estão nos EUA, Austrália e Nova Zelândia, com forte presença em vinhedos, pomares e sistemas em canteiros.

No Brasil a Embrapa lidera pesquisas na área
Por aqui experiências-piloto em regiões produtoras de uva, café e citros começam a mostrar resultados semelhantes.
De acordo com a Embrapa Instrumentação, sistemas autônomos aplicados à fruticultura já conseguem operar com precisão centimétrica e reduzir significativamente o consumo de insumos.
Além disso, a legislação brasileira, mais aberta à automação agrícola em áreas rurais privadas, vem favorecendo a introdução de tecnologias de navegação semiautônoma, especialmente em cultivos permanentes, onde as rotas são previsíveis e repetitivas. A expectativa de especialistas é que, nos próximos três a cinco anos, a automação ganhe escala em setores como cana-de-açúcar e citricultura.

Autonomia não é sinônimo de piloto automático
Com aplicativos conectados, o produtor pode planejar, despachar, monitorar e auditar tarefas em tempo real. As plataformas registram horas trabalhadas, quantidade de insumos aplicada, trajetos percorridos, desvios, paradas e taxas de produtividade por talhão (e em muitos casos, por planta individualmente).
Em sistemas modulares, um mesmo chassi elétrico executa várias funções, otimizando o investimento ao longo da safra. Resultado: menos ociosidade de máquinas, mais horas produtivas por dia e decisões mais rápidas, baseadas em dados de campo e não em estimativas.
A integração direta com fabricantes – os chamados OEMs – é outro passo essencial para a escalabilidade. Quando a autonomia é embarcada de fábrica, a disponibilidade operacional aumenta, o suporte técnico se torna padronizado e o tempo de implantação é reduzido. Para o produtor, isso significa não precisar improvisar soluções nem atuar como “beta tester” de tecnologia. Para a indústria, significa padronizar manutenção e criar ecossistemas de dados, nos quais sensores e máquinas se comunicam de forma integrada, habilitando serviços adicionais de análise e previsão.
A automação como saída para escassez de RH
A tecnologia também responde a um desafio silencioso no campo: a escassez de mão de obra. Dados da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) indicam que, em 2024, faltavam mais de 1,4 milhão de trabalhadores agrícolas no Brasil, sobretudo em culturas permanentes.
A automação permite que menos pessoas executem tarefas de maior complexidade, elevando a produtividade por trabalhador. Além disso, a aplicação mais precisa de insumos reduz perdas e impactos ambientais, o que é um ponto cada vez mais relevante nos programas de ESG e rastreabilidade de cadeias produtivas.
A próxima fronteira é levar a autonomia off-road robusta das culturas especiais para as lavouras extensivas, escalando a visão por planta para áreas inteiras de talhões.
Além disso, sensores embarcados passarão a integrar análise de qualidade de frutos, sanidade vegetal, detecção precoce de doenças e dosagem variável de insumos, tudo em um único ciclo de operação. Os especialistas projetam que, até 2030, a automação agrícola será parte central da estratégia operacional de propriedades médias e grandes no Brasil.
Setores como construção, mineração e defesa também devem aproveitar as mesmas competências técnicas: visão robusta, controle elétrico e navegação autônoma para seus próprios ambientes desafiadores.
“A automação no agro deixou de ser uma ideia para se tornar uma prática operacional. O desafio agora é escalar, integrar e garantir que os ganhos cheguem ao produtor de forma sustentável”, prevê José Américo Cunha, pesquisador da Embrapa Instrumentação.
Da redação Lonax Play.
Lincoln Gomide, Jornalista Responsável.
Com revisão da equipe de Comunicação da Lonax.
