A revolução alimentar da pecuária brasileira

O setor pecuário brasileiro tem sido palco de uma transformação que pegou o mercado de surpresa.

Em pleno ciclo de baixa (quando tradicionalmente se espera uma retração da oferta de animais) os números mostram uma expansão recorde nos abates e ganhos consistentes de produtividade no campo.

O motor desse movimento é uma combinação de tecnologia, integração de cadeias e eficiência alimentar, puxada principalmente pelo avanço do DDG, um coproduto da produção de etanol de milho que está mudando a lógica da pecuária nacional.

O DDG (Dried Distillers Grains), ou grãos secos de destilaria, é um produto resultante da produção de etanol a partir do milho. Os nutrientes que resultam do processo são gorduras, fibras e proteínas que ficam concentrados nos grãos após a destilação do etanol; daí se origina o DDG de milho.

Uma característica importante do DDG é a concentração de proteína não degradável no rúmen (PNDR), que torna esse coproduto ainda mais valioso à nutrição animal.

O teor de proteína no DDG é significativamente superior ao do milho original, devido à remoção do amido durante o processo de fermentação. Além disso, a presença de fibras contribui para a saúde digestiva dos animais, enquanto as gorduras fornecem uma fonte concentrada de energia.

O DDG é amplamente utilizado na formulação de rações para animais de produção. Graças a uma composição rica em nutrientes, o produto torna-se adequado em diversas dietas, visto que pode substituir parcialmente outros ingredientes mais caros, como o farelo de soja e o milho.

Para ruminantes, o DDG de milho favorece a manutenção da saúde ruminal e redução dos problemas metabólicos, como a acidose. Na pecuária de corte, em especial, o produto é utilizado para aumentar o ganho de peso e melhorar a eficiência alimentar. (fonte Casa do Produtor Rural/USP)

Agricultura e pecuária em simbiose

Entre janeiro e junho de 2025, foram abatidos 20,27 milhões de bovinos no país, de acordo com dados oficiais, o maior volume da série histórica para o primeiro semestre. Isso significa que, mesmo com um rebanho mais ajustado, a produção não apenas se manteve, como cresceu, o que contrariou as expectativas de analistas e agentes de mercado.

Fonte: Envato

A explicação para esse fenômeno passa por uma revolução produtiva que está redesenhando as margens e a competitividade do setor.

A rápida expansão das usinas de etanol de milho no Centro-Oeste e no interior do país ampliou a oferta do produto, permitindo que pecuaristas tenham acesso a uma alimentação de melhor qualidade para os animais confinados.

Fonte: Envato

Segundo estimativas de mercado, a produção de DDG no Brasil deve subir de 6,4 milhões de toneladas em 2025 para cerca de 11 milhões de toneladas em 2028. Esse salto não apenas reduz custos de alimentação como também aumenta o ganho de peso diário dos animais, melhora a conversão alimentar e acelera o giro de lotes, permitindo mais abates com menos cabeças no rebanho total.

Durante décadas, a pecuária brasileira conviveu com grandes variações de oferta e preços em função do chamado ciclo pecuário, no qual períodos de retenção de fêmeas e recria são seguidos por ondas de alta oferta e queda nos preços. Com a incorporação de tecnologias nutricionais e a expansão dos sistemas intensivos, esse padrão começa a ser alterado.

Nos Estados Unidos, que são referência mundial em produtividade, a média de peso de carcaça bovina supera os 300 kg, enquanto no Brasil gira em torno de 250 kg. Se o país se aproximasse do padrão americano, poderia abater até 75 milhões de animais por ano, contra os atuais 40 milhões, sem ampliar significativamente o rebanho. Isso significa mais carne, mais receita e maior competitividade nas exportações.

A integração entre agricultura e pecuária, com a oferta abundante de insumos como o DDG, é um dos fatores que permitem esse salto de eficiência. “O produtor deixa de depender exclusivamente de pastagem extensiva e passa a trabalhar com previsibilidade, produtividade e giro mais rápido. Isso transforma a lógica econômica da fazenda”, explica a zootecnista Ana Carolina Souza, pesquisadora da Embrapa Gado de Corte.

A geografia dessa revolução produtiva tem endereço claro: Mato Grosso, Goiás, Mato Grosso do Sul e oeste da Bahia concentram a maior parte das usinas de etanol de milho e dos confinamentos de grande porte. Nessa região, a proximidade entre usinas e fazendas reduz custos logísticos e garante fornecimento contínuo de DDG, ampliando as margens dos pecuaristas.

O Brasil já responde por 28% do comércio mundial de carne bovina e com a atual onda de produtividade tem potencial para ampliar ainda mais sua participação no mercado internacional. A expansão da produção de carne com maior eficiência também fortalece a posição do país como fornecedor confiável em um cenário global de volatilidade de preços e aumento da demanda por proteína animal.

Os cenários com o uso do DDG

Apesar dos ganhos econômicos, especialistas alertam que a expansão acelerada da pecuária intensiva exige planejamento e responsabilidade ambiental. O uso de DDG reduz a pressão sobre pastagens degradadas e melhora índices zootécnicos, mas também requer gestão eficiente de dejetos, controle de emissões e adequação a marcos regulatórios cada vez mais rigorosos.

A revolução produtiva em curso também está mudando o perfil do produtor brasileiro. Pecuaristas que antes atuavam de forma extensiva agora incorporam tecnologias de nutrição, gestão e automação. O confinamento, antes restrito aos grandes, torna-se mais acessível com insumos mais baratos e disponíveis.

O que está acontecendo na pecuária brasileira hoje é mais do que um ciclo de preços ou uma boa safra. Trata-se de uma mudança estrutural. Assim como a adoção de tecnologias transformou a agricultura nos anos 1990 e 2000, a pecuária vive agora seu momento de inflexão. O DDG e outras tecnologias associadas são apenas a ponta visível de um processo que vai reposicionar o Brasil no mapa global da carne.

A pergunta que se impõe não é se essa revolução acontecerá mas quem conseguirá acompanhá-la. Para os produtores que souberem se adaptar, os próximos anos podem representar ganhos de escala e rentabilidade inéditos. Para os que ficarem à margem, o risco é perder competitividade num mercado cada vez mais exigente e globalizado.

Da redação Lonax Play.
Lincoln Gomide, Jornalista Responsável.
Com revisão da equipe de Comunicação da Lonax.

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